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Biografia de Heleninha Costa

Nascida Helena Costa, em 18 de janeiro de 1924, no Rio de Janeiro, mudou-se com a família, quando ainda menina, para a cidade de Santos, no litoral paulista.

Iniciou sua carreira artística aos 14 anos, na Rádio Clube de Santos. Mudou-se depois para a cidade de São Paulo, onde atuou nas rádios São Paulo, Record e Bandeirantes. Em 1940 gravou seu primeiro disco, na Columbia: Sortes de São João, marcha de Osvaldo Santiago e Alcir Pires Vermelho e no lado "b" o samba Apesar da Goteira do Quarto (Pedro Caetano e Alcir Pires Vermelho).

Na Columbia gravou para os carnavais de 1941 e 1942. Em 1943, já de volta ao Rio de Janeiro, gravou Exaltação à Bahia, samba de Chianca de Garcia e Vicente Paiva, o maior sucesso de sua longa carreira. Naquele mesmo ano, o grupo Byington & Cia., que representava a Columbia no Brasil, rompeu com a gravadora americana e criou a Continental, que se tornou proprietária de todo o acervo de música brasileira da Columbia. O disco contendo Ninguém Sabe O Que Quer (lado A) / Exaltação à Bahia (lado B) foi relançado em dezembro de 1943, pelo selo Continental.

No Rio passou a integrar o elenco da Rádio Clube do Brasil, atuando ainda nos Cassinos Quitandinha e da Urca. No Cassino da Urca foi cantora solista de sua orquestra, o samba Exaltação à Bahia havendo sido extraído de um dos ricos musicais lá apresentados. No Cassino, contava Heleninha haver conhecido Carmen Miranda, que lhe elogiou muito a voz e deu-lhe um conselho que ela jamais esqueceu: ser sempre muito criteriosa na escolha de seu repertório. Além das atividades artísticas, Heleninha também se formou em Contabilidade.

Em 1945 aceitou o convite de César Ladeira para cantar na Rádio Mayrink Veiga. Foi também César Ladeira quem a levou, em 1947, para a Rádio Nacional, o ponto alto da carreira de um artista à época. Na Rádio Nacional ela atuou em Música do Coração e logo em todos os programas importantes da emissora. Chegou ao muito merecido estrelato, com 23 anos de idade e 9 anos de carreira artística.

Heleninha obteve grandes sucessos em disco. Vale lembrar o bolero Afinal, de Luís Bittencourt e Ismael Neto, gravado em 1951, em selo Sinter, e que permaneceu durante várias semanas em 1º lugar na Parada das Maiorais Valda, seqüência do Programa César de Alencar, que ia ao ar nas tardes de sábado. A Parada, patrocinada pelas ainda hoje existentes Pastilhas Valda, era talvez o único indicador do sucesso de discos em vendagem e freqüência de reprodução das músicas nas rádios.

O repertório de Heleninha Costa era extremamente eclético. Seu extraordinário alcance vocal possibilitava-lhe cantar sambas, maxixes, baiões, toadas, marchinhas carnavalescas, boleros, tangos... Ginga, Remexe, Remexe, Não Interessa Não, Me Dá, Me Dá, Amor Brejeiro, Juca, são algumas criações suas que enriqueceram o cancioneiro popular, e nas quais Heleninha deu vazão a sua brejeirice e carisma, marcas legítimas de sua personalidade. Baião Serenata, de Klécius Caldas e Armando Cavalcânti, foi um baião diferente, de ritmo suave e letra romântica, enriquecido por sua voz personalíssima, e que se nivelou a outras duas criações que se lhe aproximavam em gênero, ambas dotadas de grande lirismo e cantadas com calor e emoção: Santa Maria, do cancioneiro popular e para ela adaptado por Átila Bezerra, e a toada A Todos Consola, de Luiz Vieira.

Músicas carnavalescas inesquecíveis como o belo Barracão, samba de Luiz Antônio e Oldemar Teixeira, ainda hoje um clássico da música brasileira, com regravações que nunca chegaram perto, em qualidade vocal, de sua interpretação original. Ainda de carnaval, vale ressaltar Rádio Patrulha, Madeira de Lei, e a belíssima marcha-rancho de Antônio Maria e Fernando Lobo, A Noite É Grande.

Dos lançamentos de meio de ano, não há como esquecer Desde Ontem (Fernando Lobo), Siga (Fernando Lobo e Hélio Guimarães), Saudade (Fernando Lobo e Dorival Caymmi), Desespero (Eduardo Patané e Floriano Faissal), O Rio Amanhecendo (Ismael Neto e Antônio Maria), Felicidade (Luiz Antônio e Jota Jr.), Única Saída (Luiz e René Bittencourt), Poema Azul (Sérgio Ricardo)... São tantos os momentos musicais perfeitos que nos deu Heleninha Costa, que sempre faltaria espaço para nomeá-los a todos. Mas, faz-se mister mencionar três outras músicas: os majestosos sambas É Luxo Só (Ary Barroso e Luiz Peixoto) e Sinfonia do Samba (Vicente Paiva, Luiz Iglesias, Valter Pinto), e o delicioso samba, mais próximo à bossa nova, Não Tive Tempo (Haroldo Barbosa e Nanai).

Várias músicas por ela gravadas ficaram entre as 100 mais tocadas do ano de seu lançamento, a partir de Exaltação à Bahia, a 3ª mais tocada em 1943.

Em 1952, Luiz Antônio ofereceu-lhe a marcha Sassaricando, que ela recusou por achá-la ofensiva aos tradicionais velhinhos galanteadores da porta da Confeitaria Colombo, no Centro do Rio. Gravou-a, então, a mini-vedette de revistas musicais Virgínia Lane, que se tornou conhecida do público em virtude do estrondoso sucesso alcançado pela música. Mas Acho-te uma graça, última composição de Benedito Lacerda, em parceria com Haroldo Lobo e Carvalhinho, gravada por Heleninha Costa e César de Alencar, foi a melhor marcha no Concurso patrocinado pela Prefeitura do Rio de Janeiro, DF, naquele ano.

No ano seguinte (1953), o mesmo Luiz Antônio compôs para ela o seu samba maior, Barracão, que foi o vencedor do acima mencionado concurso patrocinado pela Prefeitura carioca. A interpretação dada por Heleninha tirou-lhe a marca de carnaval e tornou-o um grande clássico da música popular brasileira.

Heleninha esteve presente no primeiro LP brasileiro, lançado pela Sinter em 1951, com repertório para o carnaval, juntamente com Marion, Neusa Maria, Oscarito, Geraldo Pereira, Os Cariocas, César de Alencar e as Irmãs Meireles. Do segundo LP lançado, Heleninha participou com o seu bonito Afinal.

Heleninha Costa casou-se com Ismael (de Araújo Silva) Neto, em 1953. Ismael foi um dos mais inspirados compositores brasileiros (são de sua autoria Valsa de uma Cidade, um verdadeiro hino de amor à cidade do Rio de Janeiro, e Canção da Volta, dentre muitas outras). Em 1942, com seu irmão Severino, fundara o conjunto Os Cariocas, ainda em atividade. Heleninha Costa gravou várias composições suas, destacando-se Afinal, O Rio Amanhecendo, Voltarás, Está Fazendo Um Ano, Aconteceu... Faleceu Ismael, prematuramente, aos 30 anos de idade, em 31 de janeiro de 1956.

Heleninha voltou a casar-se, em 1962, com Paulo Grazioli, nome ligado ao rádio e à televisão. Moravam no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro, e adoravam viajar, pelo Brasil e pelo exterior. Em 1973, haviam voltado os dois de uma viagem à Europa, quando morreram, em curtos intervalos, a mãe e o pai de Heleninha. Para agravar seu difícil momento, seu único irmão foi assassinado. Abalada por tão trágicos eventos, anunciou, para espanto geral, durante uma apresentação no Programa Flávio Cavalcânti, na TV Tupi do Rio de Janeiro, ainda em 1973, sua decisão, irrevogável, de abandonar a carreira artística. No dia seguinte ao anúncio, ela desfez-se de todos os seus discos, guarda-roupa de espetáculos, e tudo mais que se relacionava à carreira encerrada.

Retornou ao microfone por uma noite, em 1975, para ser homenageada em um programa da Rádio Jornal do Brasil, no Rio de Janeiro, quando conversou, descontraidamente, sobre sua "antiga profissão de cantora". Ela narrou vários episódios pitorescos dos seus anos no rádio. Um deles foi o vexame que passou quando esqueceu parte da letra da música que ia cantar, já diante do microfone. Desde aquele momento, para sentir-se segura ao cantar, mantinha as letras diante de si, embora nunca haja necessitado consultá-las. Contou como conhecera Paulo Grazioli, seu segundo marido, na Rádio Nacional. A naturalidade de Heleninha Costa era um dos muitos aspectos positivos de sua marcante personalidade. Além da conversa informal, enriqueceu a noite com algumas músicas que haviam sido parte integrante de seu repertório, em excursões. Acompanhada pelo violão de Luiz Bandeira cantou Exaltação à Bahia, Recordações de um Romance, Saudade... Afeita a duetos, cantou com Luiz Bandeira o samba Madeira de Lei, que ele para ela compusera, em 1957. Momento único foi o inusitado dueto com Tito Madi, em disco, na canção Chove Lá Fora, que ela admitiu ser uma das músicas que gostaria de ter gravado. A outra fora Valsa de uma Cidade, de autoria do primeiro marido Ismael Neto. Quando lhe mostrou ele a canção já a havia prometido ao cantor Lúcio Alves. Embora haja gravado duas versões, Heleninha sempre era a criadora das músicas que gravava. Duas exceções foram Siga e Saudade, que gravou em 1957, para o LP Música e Poesia de Fernando Lobo.

Esta noite informal no estúdio da Rádio Jornal do Brasil, acredito ter sido a última apresentação pública da inimitável cantora. Deu seu consentimento para que a Collector's editasse o disco da série Ídolos do Rádio que lhe homenageava, mas sequer teve a curiosidade de ouvi-lo.

Não havia nenhuma amargura na atitude de Heleninha, que era uma pessoa feliz, super afável, carinhosa, elegante no vestir e no trato, amiga dos amigos. Sua voz falada era exatamente a voz da cantora. Telefonar para sua residência e escutar a mensagem no atendimento automático era algo delicioso. Paulo Grazioli certamente preferiu que a esposa gravasse a mensagem, pois era ele mesmo o maior fã de sua voz. Vale frisar que Heleninha conservou o mesmo bonito timbre de voz, com os "erres" fortes e a dicção perfeita, até a última vez que lhe ouvi a voz. Sua voz falada refletia fielmente a mesma voz que gravara Sortes de São João em 1940...

Muito comunicativa, ela adorava conversar, discorrendo sobre suas viagens, momentos perdidos no passado, pessoas que conhecera ao longo de sua vida. Mas as conversas não incluíam, por exemplo, alusões aos sucessos obtidos, ou qualquer outro detalhe que aludisse aos seus 25 anos como cantora profissional. Foram muitos os convites para que se apresentasse em espetáculos públicos, sobretudo beneficentes, mas nem este argumento último era capaz de demovê-la de sua decisão. Para ela a carreira encerra-se e ponto final.

Vale a pena transcrever o que sobre ela escreveu Ricardo Cravo Albim, em março de 1989, apresentando o LP lançado pela Collector's, Ídolos do Rádio (vol. XVI) - Heleninha Costa:

"O aparecimento de Heleninha Costa forçou um nivelamento por cima das cantoras brasileiras do rádio e do disco em meados da década de 40. É claro que sua compostura vocal, a elasticidade de seu canto e as ilimitadas possibilidades de interpretação de qualquer gênero musical - brasileiro ou não - faziam de Heleninha Costa um exemplo, um paradigma. E uma esperança de qualidade. Doce-de-coco dos arranjadores da Rádio Nacional, era a cantora preferida dos músicos e dos maestros. Programa de qualidade da Nacional sem Heleninha, nem pensar. Requisitada por todos, ela só impunha sua arte e sua voz."

A herança musical de Heleninha Costa soma 62 discos em 78 rpm, e os seguintes discos em vinil:

1) Música e Poesia de Fernando Lobo (Intérpretes: Heleninha Costa, Elizeth Cardoso e Carminha Mascarenhas). São 8 músicas, três delas cantadas por Heleninha e já antes mencionadas: Desde Ontem, Siga e Saudade. Gravação Copacabana (CLP 2040), 1957;

2) Heleninha Costa - Gravação Copacabana, 1958;

3) Canta Heleninha Costa - Gravação Todamérica (LPTA-331), 1960;

4) Ídolos do Rádio, volume XVI - Heleninha Costa (Collector's, 1989)

Coletânea de acetatos gravados em diferentes programas ao vivo na Rádio Nacional, entre 1948 e 1961.

Vale salientar a deslumbrante interpretação dada por Heleninha Costa ao clássico de Ary Barroso, Terra Seca. Ovacionada ao final, conforme narra Paulo Roberto, foi abraçada por um Ary Barroso comovido com sua interpretação. O fonograma foi extraído do programa de estréia de Ary Barroso na Rádio Nacional (Aqui está o Ary), em 27 de julho de 1956.

Helena Costa Grazioli faleceu de insuficiência respiratória na noite do dia 11 de abril de 2005, uma segunda-feira, no Hospital Gaffrée e Guinle, Rio de Janeiro. Ela estava ali internada desde o dia 8 de abril.

Seu sepultamento aconteceu no dia 9, às 15 horas, no Cemitério de São João Batista, no bairro de Botafogo, Rio de Janeiro.