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Crônica do Tempo

Rolando Boldrin

Pra mim o mundo é um relógio
E, e o dinheiro é a mola que controla os relógios dessa vida

Se o senhor tivé tempo pra ouvir a minha história
Eu começo lhe contando
Que toda a minha vida foi um grande desencontro
Entre o tempo do relógio e as oportunidades

Deus Nosso Senhor que perdoe
A minha sinceridade como um segredo
Mas inté hoje não entendi pru que é que
Pra tudo na minha vida eu sempre
Cheguei muito tarde ou muito cedo

Pra começá nasci fora do tempo, sou de sete meses
E se foi cedo demais pra dar dores
E tristezas à minha mãe com essa minha pressa de nascê
Foi tarde demais pra dar alegria ao meu, pai coitado
Ele morreu antes de me conhecê
E aí começa o meu rosário com o tempo do relógio

Já na idade de ir pra escola foi um tormento
Minha mãe, coitada, corria pra lá
E pra cá comigo de mão dada
E sempre recebendo o mesmo desengano, coitada
Não pode, dona, só pro ano, é cedo ainda
Ou então tarde demais, dona, as matriculas já tão todas fechadas

Com o tempo eu fui crescendo
Já mocinho eu procurava emprego
Porta de oficina, serviço diferente, coisa de pequena paga
E aquelas palavras do tempo me seguindo
Sempre acontecendo comigo como um relógio do destino
Olha moço não tem vaga, se você tivesse sido esperto
Agora o quadro de funcionários já tá completo "

Eu me lembro que inté pro amor eu me atrasei
Quando pra aquela cabocla que eu gostava me declarei
Ela falou pra mim, Você chegou tarde demais
Já dei meu coração pra outro rapaz

Mesmo assim um dia me casei
E desse casamento nasceu
Um menino bonito que só vendo
Foi a única coisa que me chegou na hora certa
Porque ele foi a porta aberta pro meu riso

Riso que eu já nem sabia mais como era o jeito
Dei a ele o nome de Vitório, ia ser meu grande vingador
Pra me vingá do tempo, me me vinga das hora
Dos relógio e inté dos segundo e de tudo
Me vingá dos donos desse relógio que é o mundo
Vitório o meu grande vingador

Vitório foi crescendo como pode
Logo já tinha cinco ano e a vida, o tempo
O tempo como um inimigo traidor sempre me espiando
Um dia Vitório adoentou-se como acontece c
Om quarqué criança e eu trabalhava num faz
De tudo ao mesmo tempo

Pra nenhum remédio lhe fartá, eu tinha esperança
Num dia só fui camelô, bilheteiro
Entregadô de encomenda, jardineiro, tudo
E chegava em casa moído e fedorento
De suor pra lhe abraçá e lhe beijá
E o coitadinho encuído, magrinho, dava dó, tava sofrendo

Então o douto truxe pra vê ele, é home bão
Atencioso, que logo dispois de examiná falô assim
Corre, vá depressa compra essa receita
Seu filho não tá bãoquem sabe se com isso ele se ajeita
E chacoalhando a cabeça foi-se embora
Quem sabe aconseiando uma promessa

Como eu não tinha dinheiro pro remédio
Dei de garra num véio despertadô lá de casa
A única coisa de valor, pensando
Que podia vendêr ele num brechó
E saí correndo, bem correndo

Mas inté hoje não entendi pru
Que ouvi uns grito na rua
Pega ladrão, pega ladrão
E gente amuntuando pro meu lado
Quem sabe imaginando que eu era argum malfeitô
E foi soco, bordoada, pontapé
E quando eu pude percebê já tava
De pé na frente de um delegado

Doutô, meu filho tá doente, tá morrendo
Por favô, eu tenho aqui uma receita ó, e supliquei chorando
O tár delegado então acreditando falô pro guarda
Pega o carro da rádio patrulha, leva o moço
E me entregando um toco de dinheiro do seu borso, arrematô
Corre, corre, compra o tár remédio pro seu filho na farmácia

Eu fui embora correndo, correndo
Correndo comprei o remédio
E vortei feito um raio, feito um raio lá pra casa
Mas como sempre na vida eu corri contra o tempo, esse covarde
Quando abracei meu filho é que eu vi
Mais uma vez eu tinha chegado tarde

Composição: Mariano da Silva





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