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Biografia de Zé Carreiro e Carreirinho

Zé Carreiro (Lúcio) e Carreirinho (Adauto) foram consagrados como Os Maiores Violeiros do Brasil.

Lucio Rodrigues de Souza, o Zé Carreiro, nasceu no dia 24 de dezembro de 1922, numa fazenda que fazia divisa com Santa Rita do Passa Quatro. Aos sete dias de vida, foi batizado na antiga Igreja de São Sebastião, de Porto Ferreira, passando mais tarde a residir na cidade.

Aos 15 anos, foi empregado da Cerâmica Porto Ferreira. Posteriormente, mudou-se para São Paulo.

No final da década de 1940, depois de cantar em diversas duplas, conheceu Adauto Ezequiel, natural de Bofete, formando a dupla que foi batizada pelo compositor Armando Rosas com o nome Zé Carreiro e Carreirinho.

Sempre ligado a Porto Ferreira, onde passou a infância e adolescência, Zé Carreiro sempre mencionava a terra do balseiro João Ferreira, o Rio Mogi-Guaçu, a vida da caça, do mato, em inúmeros carurus e modas de viola que compôs.

No dia 5 de julho de 1950, a dupla estava nos estúdios da gravadora Continental, para as duas primeiras gravações em disco (bolachão) de 78 rpm, com as músicas Canoeiro (cururu) e Ferreirinha (moda de viola), com grande sucesso.

Zé Carreiro e Carreirinho fizeram apresentações em circos, bailes, shows, rádios de todo o Brasil e seguiram outras gravações em disco, até 1958, quando se separaram.

Durante um ano, Zé Carreiro fez parceria com Pardinho, que em 1959 fez dupla com Tião Carreiro. Nesse ínterim, Carreirinho fez dupla com Tião Carreiro.

No dia 21 de maio de 1970, Lucio Rodrigues de Souza faleceu na cidade de São Paulo. Porto Ferreira, para eternizar e homenagear a pessoa de seu compositor e representante da música interior paulista destinou-lhe, em 1985, o nome de uma rua do Bairro Serra D’água.

No ano seguinte, a senhora Célia Ribeiro e o professor Luiz Rosa Camargo, através do GEMT (Grupo Ecológico Minha Terra), organizaram uma homenagem ao compositor, recebendo sua mãe, então com 88 anos, diversos familiares e amigos que presentearam o Museu Histórico e Pedagógico com a viola de Zé Carreiro, alguns discos de 78 rpm, seus dados biográficos e fotografias.

Zé Carreiro gravou mais de 50 discos de 78 rpm, alguns LPs e dois compactos.

Devido a problemas de surdez e nas cordas vocais, teve dificuldade para continuar gravando, entretanto sua inspiração não esmoreceu.

Zé Carreiro e Carreirinho foram consagrados como Os Maiores Violeiros do Brasil.

CARREIRINHO (Adauto Ezequiel) aos sete anos cantou uma modinha de sua autoria numa comemoração escolar de fim de ano, recebendo de presente uma viola. A partir de então, passou a apresentar-se em festinhas, cantando e tocando.

Em 1946 estreou profissionalmente ao lado de Ferraz, atuando nos circos que passavam pela cidade de Sorocaba SP. Seguiu depois para São Paulo SP, onde se apresentou na Rádio América.

Mais tarde, transferiu-se para a Rádio Record, ali atuando com novo parceiro, o investigador de polícia José Stramandinoli (Zé Pinhão), com quem formou a dupla Zé Pinhão e Pinheiro, que passou a participar do programa Sítio do Bicho-de-Pé até 1947, ano em que se separaram.

Em 1947, Adauto propôs parceria a Lúcio Rodrigues, que cantava com Fortaleza. Formaram então uma dupla cujo nome foi escolhido em concurso popular entre os ouvintes da Rádio Record: Zé Carreiro(Lúcio) e Carreirinho (Adauto).

Alguns anos depois quando a dupla já estava ficando conhecida e fazia sucesso em todas as suas apresentações com o Canoeiro, Tonico e Tinoco gostaram da musica e se interessaram em gravá-la.

Surgiu então a oportunidade para gravarem seu primeiro disco, pois somente consentiram em ceder a música, mediante a promessa do lançamento do seu primeiro disco, que saiu alguns meses depois com Canoeiro e Ferreirinha; o sucesso foi tão grande que a gravadora resolveu contratá-los.

Com o passar do tempo o sucesso da dupla já estava solidificado, atuando em diversos programas de rádio e fazendo músicas que marcaram como Crianças do Meu Brasil (José Fortuna), Jamais Seremos Esquecidos de autoria da dupla, Sinhá Maria, versão sertaneja da composição de Renê Bittencourt e Bubuê de Flor também de autoria da dupla.

Zé Carreiro e Carreirinho gravaram vários LPs e atuaram por dez anos na rádio Record com audiência absoluta. Zé Carreiro teve que se afastar da vida artística devido a um problema de surdez. Carreirinho continuou fazendo duplas de sucesso com vários outros parceiros.

Numa casinha branca fincada bem no pé da serra moravam o Sr. João Batista Ezequiel e D. Domitilde Maria Pereira. Ali, perto de Botucatu, de Pardinho, do campo do espraiadinho, o Sr João tinha três sítios onde plantava café, e tinha umas "criação". Com D. Domitilde tinha três filhos, um homem e duas mulheres. O Sr João era filho de alemães e D. Domitilde era brasileira.

No dia 15 de outubro nasceu o quarto filho do casal, batizado Adauto Ezequiel, hoje conhecido no Brasil inteiro como Carreirinho.

Contar a história de Carreirinho é tarefa das mais gratificantes, tão rica e tão lindamente recheada com causos interessantes que torna-se impossível fazer-lhe justiça em espaço tão pequeno.

A história de Carreirinho mistura-se com a história da música sertaneja-raíz, com a história da moda-de-viola e das duplas caipiras. Carreirinho, hoje com 77 anos de idade, tem 1.680 músicas, de sua autoria, gravadas. Sempre foi, e ainda é, ao lado de Raul Torres, Serrinha, Tinoco e Zé da Estrada, considerado uma das melhores primeira-voz do Brasil.

Quando tinha oito anos de idade, ainda Adauto, ficava apreciando o Sô João Tropeiro a pontear uma viola. Ele era um sitiante, vizinho e meeiro do seu pai, e um excelente violeiro.

Quando o pai saia para alguma viagem pedia que lhe trouxesse uma viola, o que nunca acontecia. O Sr. João achava que viola era coisa de vagabundo e não queria um filho assim.

Mas, uma vez, o pai ia a Tatuí e, como sempre Adauto lhe pediu uma viola. Na noite anterior a viagem a mãe havia conversado com o Sr. João sobre a viola. Disse que não via mal algum em trazer-lhe uma. "Foi um alegria danada. Quando vi meu pai na curva da estrada, montado numa mula ruana com um pacote grande na mão, eu já sabia. Ele estava trazendo a minha viola. Não sabia o que fazer. Fui abrir a porteira pra ele. Nunca tinha sido gentil com ele. Peguei a viola e levei pro João Tropeiro afinar pra mim. Daí num parei até hoje. Aprendi a pontear com João Tropeiro. Cada horinha de folga eu tava com a viola. Peguei gosto," conta Carreirinho.

A primeira vez: "Em 1936, quando estava no último ano do primário e na escola ensaiava para a formatura o diretor disse um dia: Fulano vai declamar um poema, ciclano também declama ... aí eu falei: e eu toco uma moda de viola. Foi minha primeira vez em público. Cantei uma moda minha: "Minha vida". Fui muito, mas muito aplaudido mesmo.

Aí o tempo foi passando e Adauto, como ele mesmo confessa, nunca pegou duro nas lidas da roça. Era o mais novo e era poupado. Mexia com o gado leiteiro, com amansação das potrancas e..., num podia ser diferente, quando sobrava um tempinho, tava ele com a viola no colo.

Começou a cantar músicas de Raul Torres e num circo formou sua primeira dupla: Adauto e Ferraz. Durou um ano. Foi em 1945.

Querendo ir mais fundo no mundo da viola mudou-se para São Paulo, onde formou sua Segunda dupla com o Piracicaba ( Botucatu e Piracicaba ) e fizeram durante o ano em que estiveram juntos, 1946, um programa ao vivo na rádio América, São Paulo.

Nesse tempo encontrou-se com um conterrâneo que morava em São Paulo e já gostava de cantar. Nasce a terceira dupla. Adauto passou a chamar-se Pinheiro e formou a dupla Pinheiro e Zé Pinhão. No dia 7 de junho de 1947 estrearam, ao vivo, na rádio Record de São Paulo, o programa " Sítio do Bicho de Pé". Zé Pinhão, que era policial, estava encontrando incompatibilidade de horário entre o seu serviço e música. Optou pela polícia.

Adauto é quem conta agora: "Fiquei perdido, sem dupla. Um dia, era domingo, eu estava ouvindo o
"Chico Carretel" na rádio Piratininga. Ouvi lá: Lúcio Rodrigues e Fortaleza. Escutei, prestei atenção e vi logo: tá aqui a minha segunda voz. Me arrumei e corri lá prá Piratininga, que ficava ali na Praça Patriarca. Quando cheguei, tinha um café em baixo e perguntei pelo tal Lúcio Rodrigues. Tinha acabado de sair. Me deram o endereço dele. Um prédio na Alameda Gretchen, em frente a garagem dos bondes. Fui lá".

"Ninguém conhecia Lúcio Rodrigues. Por sorte alguém lá no café tinha me contado como ele era. Mulato, magro, 1.70m, cabelo onduladinho. Já voltava vindo embora, quando vi um moço indo em direção aquele prédio e que se parecia com aquela descrição. Aí falei comigo: Vou gritar Lúcio, se ele olhar é porque é ele, e gritei.

Nos apresentamos, falei o que eu queria mas ele disse que num tinha interesse. Que tava bom com o Fortaleza.
Dava um dinheirinho prá pagar o cigarro e o almoço. Ai eu disse prá ele que comigo ele podia, no programa da Rádio Record, ganhar uns 600,00 por mês. Isso era mais ou menos uns três ou quatro salários da época. Ele num disse nada mas ficou com meu endereço. Na semana seguinte chegou em minha casa já trazendo "Canoeiro".

Acertamos a dupla e fomos fazer o primeiro programa na Record. Armando Rosas que era o diretor do programa falou o seguinte: " se vocês não se separarem será a maior dupla sertaneja do Brasil".

Toda terça feira tinha o nosso programa ao vivo. Aí precisava arrumar um nome pra dupla. Na própria rádio o Blota Jr. Sugeriu " Tupi e Tupã. J. Pinheiro sugeriu "Pardinho e Pardal". Armando Rosas, " Zé Carreiro e Carreirinho" e o Adoniran Barbosa sugeriu "Minguinho e Mingote".

O nome foi escolhido através de cartas dos ouvintes do nosso programa. Zé Carreiro e Carreirinho venceu longe. Ainda bem que ninguém votou em Minguinho e Mingote".

Em 1950, mais precisamente 20 de agosto de 1950, gravamos Zé Carreiro e Carreirinho, nosso primeiro disco. Um 78 rpm, onde de um lado tinha "Ferreirinha" e do outro "Canoeiro".

Nessa época faziam sucesso no gênero, as duplas Raul Torres e Florêncio, Tonico e Tinoco, Palmeira e Luizinho, Serrinha e Caboclinho. Zé Carreiro e Carreirinho assinaram então, depois de algumas artimanhas, um contrato de três anos com a Continental.

Em 1950 Tonico e Tinoco, que eram contratados da Continental, se interessaram pelo cururu O canoeiro (Zé Carreiro), música que vinha marcando as apresentações da dupla iniciante.

Mediante acordo com o diretor da gravadora, consentiram na gravação de Tonico e Tinoco, conseguindo em troca gravar o primeiro disco, com O canoeiro e Ferreirinha (de sua autoria).

O sucesso desse lançamento levou a fábrica a contratá-los. Seis anos depois, a dupla lançou, pela Copacabana, Crianças do meu Brasil (com José Fortuna) e Jamais seremos esquecidos (de autoria da dupla), e, no ano seguinte, pela Victor, Sinhá Maria, versão sertaneja da composição de René Bittencourt do mesmo nome, e Buquê de flor (da dupla).

Em 1958, depois de dez anos de atuação na Rádio Record e de gravar diversos discos, Zé Carreiro teve de se afastar da vida artística por surdez.

Formou, então, com José Dias Nunes, nova dupla, Tião Carreiro e Carreirinho, que gravou em 1958, pela Continental, Rei do gado (Teddy Vieira), Mariposa do amor (Canhotinho e Torrinha), Pirangueiro e Saudade de Araraquara (ambas de Zé Carreiro), e Despedida de solteiro (com Zé Fortuna).

Depois a dupla gravou pela RCA algumas composições de gênero mais sentimental, com Madalena, O beijo (ambas de sua autoria) e Esqueça a sua Maria (Raul Torres e João Pacífico).

Em 1962 lançou, com Zé Carreiro, pelo selo sertanejo da Chantecler Meu carro e minha viola (com Mozart Novais), faixa que deu nome ao LP, Boi cigano (Tião Carreiro e Pião Carreiro) e Terra roxa (Teddy Vieira), entre outras.

No mesmo ano, apareceu num LP lançado pela Chantecler em homenagem à antiga dupla com Zé Carreiro, relembrando sucessos como Canoeiro, Ferreirinha e Pirangueiro (Zé Carreiro).

Afastando-se de São Paulo, só voltou a gravar mais tarde, com sua nova parceira na dupla Carreirinho e Zita Carreiro (Iracema Soares Gama), que lançou pela Continental, no selo Cartaz, Flor de minha vida (com Zé Matão), Saudade (com Caboclo), Encontro fatal (com J. Vicente), Vem meu amor (com J. Vasco) e Mundo vazio (com Pardinho).

Em 1974, a nova dupla gravou na Chantecler um pot-pourri intitulado Recordando Zé Carreiro, além de outras músicas, como Deus é meu guia (com Zuza), Saudade do nosso amor (Teddy Vieira e Tião Carreiro), Rincão de nossa terra (sua autoria), Cão fiel (Zé Godói e Biguá), Tormento da noite (Cafezinho e Nhô Juca).

No ano seguinte, a dupla gravou na Carmona, Formigueiro de gente e Policena, além de Palhaço (com Miguel Santiago), em homenagem aos palhaços.

Em 1979 a Secretaria de Cultura da prefeitura de São Paulo homenageou a dupla com uma festa realizada no ginásio de esportes do Sport Club Corinthians Paulista.

Em 1980, em Curitiba/PR, receberam uma placa de Honra ao Mérito dos artistas paranaenses.

A dupla ficou junto por 12 anos e gravaram 110 discos 78 rpm e 4 LP's.

Zé Carreiro parou de cantar por volta de 1963 porque foi perdendo suas faculdades vocal e auditiva.

Depois de Zé Carreiro mais quatro duplas se formaram com Carreirinho. Tião Carreiro, durou quatro anos e gravaram dez discos 78 rpm e um LP. Zita Carreiro, durou 16 anos e gravaram 12 LP's, dois compactos duplos e um compacto simples. Zé Matão, durou cinco anos e gravaram cinco LP's.

Hoje seu parceiro é Carreiro. Estão juntos desde 1991 e já gravaram um LP e dez CD's. Carreirinho, o que você diria, que conselhos daria prá quem quer ser violeiro, prá quem quer começar?

"Pra tocar viola só os anos. Num tem método, nem escola, nem professor. Nunca fui um bom violeiro, sempre segurei na voz mas só o tempo faz um violeiro. Eu tive muita sorte. A dupla cantava bem. Àqueles que pretendem começar, se tiver talento, cantar bem e tiver muita vontade, começe. Mas só se for por paixão. Quem quiser começar prá fazer sucesso ou ganhar dinheiro vai dar furo n'água. Além disso a coisa mais importante que tem que saber é escolher um bom repertório. Isso vale prá qualquer um que queira começar bem."

Sobre a ser cantor sertanejo-raíz: "Sou um apaixonado pelo que faço. Nunca, nem uma vez pensei em desistir. Arranco minhas músicas do coração, do fundo do peito. Faço o que gosto. Num posso deixar disso (cantar) . É minha vida. Gosto de compor. Ninguém aprecia mais do que eu as minhas músicas. O grande fã de Carreirinho é Carreirinho. Quando sento prá ouvir Carreirinho não atendo ninguém, nem telefone, nem nada.

Sobre os shows: "99 % do que já gravei é composição minha. Nos shows só toco músicas minhas. Eu escolha a música que vou abrir os shows. Normalmente abrimos com "Caboclinha". Daí prá frente é o que a platéia pedir. E pode pedir qualquer uma. O show é totalmente improvisado. Sempre foi assim, desde Zé Carreiro. Saio prá fazer um show mas num sei o que vou cantar, é o que a platéia pedir. Nunca houve um show em que não houvesse pedidos.

Aos 87 anos, Adalto Ezequiel faleceu em março/2009 num hospital paulistano, vítima de complicações após um derrame que o deixou inconsciente e respirando com a ajuda de aparelhos há mais de uma semana. O velório e o enterro serão realizados hoje no Cemitério Jaraguá, no Km 23 da rodovia Anhanguera, em São Paulo.

Carreirinho nasceu em 1921 na pequena Bofete, interior de São Paulo, a mesma cidade descrita e estudada no clássico da sociologia Parceiros do Rio Bonito, de Antonio Candido, para relatar a cultura caipira. Bofete hoje tem até praça com monumento de Carrerinho.

Entre suas principais músicas, está "Ferreirinha" - a crônica de um peão que procurava seu amigo desaparecido depois de sair para tocar uma boiada. O encontrou morto e fez um malabarismo para levá-lo para um enterro decente.

Outro marco de sua carreira foi a moda "Canoeiro", um causo de pescaria de final de semana. A toada ficou marcada na memória de quase todos que têm mais de 40 anos de vida e apreciam a música raiz.

Nos últimos anos, estava mais afastado de apresentações por dificuldades de saúde. Mesmo assim compareceu a algumas homenagens, na maior parte das vezes acompanhado por seu ex-parceiro de viola Carreiro e a família de catireiros de Oliveira Alves Fontes, em Guarulhos.